“Como está, a lei de delações corrói a economia e também a democracia”

Como está, a lei de delações corrói a economia e também a democracia

Reinaldo Azevedo

05/07/2019 08h45

A carta de Léo Pinheiro é um instrumento a que tem direito de recorrer a sua defesa, mas só é possível porque o país está hoje submetido a uma aberração patrocinada, vejam que coisa!, pelo PT, em 2013, e homologada, com discurso tonitruante, por Dilma Rousseff: a Lei 12.850, que estabelece as bases para a delação premiada.

Leio que o senador Jaques Wagner (PT-BA) se disse arrependido de ter ajudado a aprovar o texto. Afirmou:
“Hoje, sou obrigado a dizer que me arrependo de ter contribuído porque nós não fomos, na minha opinião, no detalhe [da lei]”.
Referindo-se a Léo Pinheiro, disse:
“Eu conheço o Léo Pinheiro. O que ele deve ter passado lá dentro! Não sei que tipo de ameaças que ele recebeu. É impossível você falar de uma contribuição livre e espontânea de alguém que está preso.”

Não sou fã de delações premiadas e barganhas. Nos dois casos, o que vejo é o Estado manipulando uma espécie de refém em benefício da versão que o aparelho estatal quer ouvir. Pior: este se torna preguiçoso para investigar. Mas também sou realista e sei que o direito penal é, de todos, o mais permeável às pressões bárbaras. Mas é preciso que se discipline a bagunça.

Houvesse no Parlamento liberais realmente dignos do nome — no Brasil, os que reivindicam essa condição falam uma linguagem policialesca e se dedicam ao populismo penal mais estúpido —, e a lei 12.850, promovida e sancionada por Dilma no desespero, para tentar se livrar da pressão das ruas, passaria por um severo escrutínio.

Para começo de conversa, teria de haver um tempo definido para uma eventual delação a partir do momento em que a pessoa tem ciência de que é investigada. Terá a chance de dizer tudo o que sabe. E se vai estabelecer o benefício a depender da veracidade dos fatos elencados. A colaboração deveria ter um limite: até a apresentação da denúncia. Virou réu, já era.

Hoje, a delação é um “work in progress”, uma obra aberta. O delator pode ir ajustando as suas versões, submetendo-as também, como se nota acima, às conveniências do órgão investigador. A forma como a Lei 12.850 está sendo empregada entre nós não destrói apenas o devido processo legal. Ela está corroendo também a democracia porque permite que Ministério Público e Polícia Federal passem a operar como um Estado policial.

Vejam lá o caso de Sérgio Cabral. Com quase 200 anos de condenações nas costas, ele começou a “colaborar”. Ainda não é uma delação premiada. Mas nada impede que venha a ser. Parte do ritual, ele já cumpriu: diz-se arrependido, já elogiou o juiz Marcelo Bretas e já pôs na mira alguns nomes que são adversários políticos das afinidades eletivas já expressas pelo magistrado.

Por enquanto, estamos vivendo sob uma espécie de ditadura da Lava Jato, que alega o nobre propósito de combater a corrupção. Juízes saem em massa em defesa de Moro, como se estivesse em causa uma disputa corporativista. Não! Trata-se do devido processo legal. A ditadura eventual da Lava Jato, tudo o mais constante, é só a antessala da pior de todas as ditaduras: a da anarquia.

https://reinaldoazevedo.blogosfera.uol.com.br/2019/07/05/como-esta-a-lei-de-delacoes-corroi-a-economia-e-tambem-a-democracia/

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