História de uma das vítimas de Moro

Ex-diretor da OAS absolvido pela Justiça enfrentou depressão na cadeia

Marcelo Camargo/Divulgação/Agência Brasil
Mateus Coutinho de Sá ao chegar a sessão da CPI da Petrobras
Mateus Coutinho de Sá ao chegar a sessão da CPI da Petrobras

WÁLTER NUNES
DE SÃO PAULO

Na manhã da sexta-feira 14 de novembro de 2014, o então diretor financeiro da empreiteira OAS, Mateus Coutinho de Sá, com 36 anos, foi retirado de sua casa, em São Paulo, por policiais federais e levado para a superintendência da entidade em Curitiba (PR).

Ele era um dos alvos da 7ª fase da Operação Lava Jato, batizada de Juízo Final.

O juiz Sergio Moro havia determinado a prisão de presidentes e executivos de algumas das principais empreiteiras do país, altos funcionários da Petrobras e de operadores financeiros.

Todos eles, sem exceção, chegaram à carceragem da Polícia Federal na capital paranaense jurando inocência.

Pouco mais de dois anos depois, as provas contra os que foram presos naquele dia se avolumaram e a Lava Jato avançou para desvendar um dos maiores esquemas de corrupção do país.

O caso do executivo Mateus Coutinho de Sá, porém, destoa desse enredo.

A acusação contra ele era ajudar na distribuição de propina decorrente de contratos da OAS com a Petrobras em obras da Refinaria Getúlio Vargas e Refinaria do Nordeste Abreu e Lima.

A empreiteira é acusada de ter pago propina de 1% sobre o valor destes contratos e dos aditivos à diretoria de Abastecimento da estatal, comandada na época por Paulo Roberto Costa.

Condenado por Moro por corrupção, lavagem de dinheiro e pertencer a uma organização criminosa, Coutinho foi absolvido na última quarta-feira (23) por unanimidade pelos desembargadores da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Os juízes do órgão de segunda instância consideraram que não havia provas de que ele havia cometido esses crimes.

Ao absolverem Coutinho, os desembargadores aplicaram uma rara derrota em Moro, responsável pela Operação Lava Jato.

Coutinho chegou à cadeia dizendo aos colegas que tudo não passava de um engano e que seus advogados provariam rápido sua inocência, o que não convenceu seus colegas de cárcere.

Pai de uma menina pequena, recomendou à mulher que não a levasse para visitá-lo na prisão para evitar desgastes –afinal, ele tinha convicção de que não ficaria ali por muito tempo.

SAUDADES

Os presos da Lava Jato já se conheciam pelas relações de negócios que tinham fora da cadeia, mas Coutinho era um estranho na turma, segundo um empreiteiro que conviveu com ele na PF. Não era daquele mercado.

Coutinho foi colocado na cela de número 6 junto com os empreiteiros Erton Medeiros Galvão, presidente da Galvão Engenharia, João Auler, ex-presidente do conselho administrativo da Camargo Corrêa, e Sérgio Cunha Mendes, vice-presidente e herdeiro da Mendes Júnior.

No cubículo havia apenas um beliche, e Coutinho, por ser o mais novo, dormia num colchão no chão. Os ex-companheiros de cela o descrevem como sociável, equilibrado e simpático.

Essas características, porém, davam lugar à tristeza toda vez que ele falava da filha. Reclamava repetidamente da saudade que sentia. Ficava deprimido quando se dava conta da ausência dela.

O agente federal Carlos Henrique, que havia estudado psicologia, percebeu o problema de Coutinho e passou a conversar com ele, tentando animá-lo.

Outro agente, menos sensível àquele drama, foi pela via contrária. Num dos dias em que Coutinho lamentava a falta que sentia da menina, ele o provocou dizendo que não a veria tão cedo.

Coutinho perdeu a calma e, não fossem os colegas de cela, teria partido para cima do agente.

VOLTA PARA CASA

Como os pedidos de liberdade caíam um a um nos tribunais superiores, Coutinho passou a estudar a possibilidade de receber a filha numa visita, mas queria preservá-la dos dissabores de uma cadeia. Fez um acordo com a direção da carceragem e a menina foi vê-lo num dia sem visitas de outros presos.

A sala destinada às visitas fica longe das celas. Mesmo assim os presos ouviram a menina gritar “pai” quando o viu. Segundo um executivo preso na PF, não houve quem não se emocionasse na hora.

Coutinho ainda ficou preso até o dia 28 de abril de 2015, quando, por decisão apertada, os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram que ele e outros presos da Lava Jato poderiam responder ao processo em prisão domiciliar. Colocou tornozeleira e foi pra casa.

Em agosto daquele ano, Moro trocou a domiciliar por medidas cautelares. Entre as restrições teve que se afastar de atividades econômicas e comparecer à presença do juiz em prazos determinados.

Também perdeu o emprego na OAS, ficou proibido de manter contato com outros réus e entregou passaporte.

Pessoas próximas de Coutinho dizem ainda que nesse processo todo perdeu o casamento e ainda sofre preconceito por ter sido preso na Operação Lava Jato.

“Eu lamento muito que ele tenha passado o tempo que passou numa prisão”, diz o advogado Juliano Breda. “Nenhum dos delatores da Lava Jato tinha dito que Coutinho praticou qualquer tipo de crime. Ele não tinha absolutamente nada a ver com qualquer esquema.”

Coutinho não respondeu às ligações da Folha. Por mensagem, disse que não tinha condições de dar entrevista. Limitou-se a dizer que quer reconstruir a vida.

http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/11/1835947-ex-diretor-da-oas-absolvido-pela-justica-enfrentou-depressao-na-cadeia.shtml

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