“Sérgio Cabral e a Masmorra”
Por Doutor Semana
Caros leitores,
Depois de falarmos sobre dois pesos e duas medidas na Justiça brasileira, quero trazer um novo tema: o abuso de autoridade sem constrangimentos ou punições.
Não falo do abuso maior, de prisões e condenações excessivas ou precipitadas, ais quais já são motivo de acaloradas discussões em rodas de advogados e juízes pelo Brasil e, mais recentemente, tema debatido em editoriais em nossos maiores jornais.
Quero falar de um tipo específico de abuso, mais comezinho, menos midiático, conhecido pela marginalidade carioca como “esculacho” e que agora também é exercido com desenvoltura contra os condenados famosos da Lava Jato.
Quero usar um personagem especial: o condenado Sérgio Cabral. Antes bajulado pela elite carioca, e por mais de uma década o político mais poderoso do Rio, hoje circula, mesmo com sua baixa periculosidade, entre Benfica e Bangu, com direito a temporadas em Curitiba.
Sua primeira experiência de abuso, ainda nos primeiros dias de cárcere, foi quando um jovem procurador da República pediu que ele se identificasse numa fila indiana de prisioneiros. Cabral se identificou como ex-governador do Rio, ato que o “diligente” integrante do parquet corrigiu prontamente para “prisioneiro Cabral”. O ainda incauto preso caiu em prantos. Alguns dias depois desse infausto episódio, o “prisioneiro Cabral” tomou uma dose excessiva de remédios que, fora alguns desmaios e visível prostração, por sorte não tiveram maiores consequências.
Alguns meses atrás, fomos todos expostos à plangente figura do ex-governador sendo transferido para Curitiba, por um capricho de um magistrado que se sentiu ameaçado (?!) durante uma audiência. Algemado pelas mãos, pés e cintura, parecia um vilão, destes com poderes especiais dos filmes Marvel.
Seria ridículo e risível, se antes não fosse cruel e patético.
Todos sabem que o único poder do ex-governador foi ter usado o cargo para pedir comissões a empresários ou fraudado licitações. Crimes graves, sim, e que devem ter consequências. Mas nunca com a crueldade e perversidade aqui descrita.
Eis que nesta semana o “prisioneiro Cabral” é novamente removido, desta vez para a solitária. O motivo: contestou a ordem de um jovem promotor que queria vê-lo olhando para parede enquanto este fazia uma revista em sua cela. Pobre excesso de poder.
Outro dia já elogiei, neste espaço, nossa capacidade investigativa e o alcance, antes impensável, que nossos agentes da lei passaram a ter. Um avanço, dentre poucos recentes, para este sofrido Brasil.
Mas para que essa importante conquista não vire um pesadelo institucional, temos que urgentemente criar regras e limites para nossos novos “heróis”. Aquilo que os vizinhos ianques chamam de ‘checks and balances’.
A desenvoltura que estes jovens e imberbes concursados, com independência funcional, têm exercido seu quase ilimitado poder está deixando a sociedade pensante de cabelo em pé.
A oportunidade de poder humilhar uma ex-autoridade, ou um figurão abastado, tem trazido deslumbramento e regozijo a alguns, mas, vamos e venhamos, é de embrulhar o estômago do observador isento.
A civilização deixou, há muitas décadas, a escravidão, os duelos mortais, as lutas entre prisioneiros para diversão geral. Essas barbáries não fazem parte de nenhuma sociedade moderna. Não vamos, então, andar para trás.
Abaixo às masmorras; e punição imediata aqueles que caíam na tentação de serem os carrascos de plantão!
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