FALÊNCIA INSTITUCIONAL
“Mãos limpas” foi um evento político, diz historiador Giovanni Orsina
29 de agosto de 2017, 11h42
Reverenciada pelo juiz Sergio Moro, a operação mani pulite (mãos limpas), na Itália, foi um evento político que gerou uma crise política. A afirmação é de Giovanni Orsina, professor da universidade LUISS-Guido Carli, em Roma, um dos principais historiadores do fenômeno do berlusconismo.
“Juízes e promotores viraram atores políticos, mas é muito difícil apontar se eles faziam isso por alguma agenda”, afirmou o professor, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo. Ele é autor de obras como O Berlusconismo na história da Itália (2013), A República depois de Berlusconi (2011) e Sem igreja nem classe (1998).
Orsina criticou aspectos “moralistas” de juízes da mãos limpas, que varreu os partidos tradicionais de 1992 a 1994 e viu seu magistrado-símbolo, Antonio di Pietro, virar político.
Segundo ele, em vez de a sociedade se responsabilizar também pela situação, os italianos resolveram colocar toda a culpa nos políticos. E, afirmou, a sociedade achou que se você se livrasse de bodes expiatórios, tudo ficaria bem. “Apoiaram a mãos limpas, só que nada foi plantado exceto a ideia de que a política é ruim, e que os magistrados eram mágicos”.
Dentro dessa busca pela moralidade, Silvio Berlusconi foi eleito. “Ele não era um político, e para a sociedade os políticos não eram mais necessários”, diz o professor, acrescentando que a sociedade acreditou que, por ser bilionário, Berlusconi não precisaria roubar.
A história, no entanto, não saiu como o esperado. Eleito, Berlusconi ajudou a desmontar a mãos limpas e acabou banido de cargos públicos, até 2019, por corrupção. Apesar disso, ele ainda pretende disputar as eleições em 2018 e lidera um dos maiores partidos da Itália.
“A Itália nunca se recuperou das mãos limpas. O sistema político ficou tão enfraquecido que mesmo um personagem como Berlusconi, acusado de tantas coisas, ainda é um grande ator”, comentou Orsina.
Sem fazer comparações diretas com o Brasil, o professor afirmou que o indiciamento ético da classe política era moral, não judicial. Assim, caberia aos próprios políticos resolverem a questão. “A lição que ficou da crise na Itália é uma muito difícil de ser ouvida: a política é uma atividade necessária, tem suas próprias regras e seu próprio tempo”, afirmou.
Revista Consultor Jurídico, 29 de agosto de 2017, 11h42
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