O direito no Brasil, em que pese a Constituição da República, os Pactos, Tratados, Declarações e Convenções ratificados pelo Brasil e da legislação infraconstitucionais, infelizmente, parece que entrou definitivamente em decadência.
Vejam o caso do juiz Marcelo Bretas que, “contrariado” por uma decisão da “maior instância superior”, o STF, decidiu simplesmente não decidir.
O caso é o seguinte: o juiz mandou prender preventivamente um monte de gente, ou seja, seguiu o ritual da banalização que se tornou a prisão preventiva no Brasil.
É bom que se diga que a prisão preventiva é medida excepcionalíssima se se for aplicar as regras do jogo vigentes no país.
A prisão cautelar (preventiva ou temporária), segundo o entendimento que tenho da Constituição da República, se (ainda) não é, fica muito próxima da inconstitucionalidade ou inconvencionalidade. Só não afirmo peremptoriamente ser inconstitucional ou inconvencional porque, efetivamente, há casos extremos, excepcionalíssimos, que comportam a prisão cautelar.
O problema hoje no Brasil é que a prisão preventiva foi banalizada pelo Poder Judiciário e, desgraçadamente, tornou-se o melhor espetáculo para o povo, isso quando a prisão preventiva não atinge um amigo, um parente etc.
Nesse caminho que parece sem volta, da preguiça institucional e/ou incompetência aliada ao processo penal do espetáculo, não se utiliza mais nenhum meio de investigação nos casos criminais. O meio “mágico” é a prisão preventiva. Prende-se para investigar, para se obter confissão, para obter aplausos da plateia.
É com desolação constatar que a prisão preventiva se tornou a rainha do processo penal brasileiro e, pior, com a cumplicidade de grande plateia e de grande parte do Poder Judiciário. É o direito, depois de centenas de anos até se chegar à civilização, sendo reconstruído “macunainamente” no Brasil.
Estamos a vivenciar tempos que se pode chamar de “escola do direito exótico brasileiro” ou “escola da malandragem do direito” que, com certeza, só chegará nas terras civilizadas por motivo de riso dos outros de lá e vergonha nossa.
Quando falo de “malandragem do direito” é porque existem dezenas de meios de investigação criminal disponíveis no Brasil [depoimento pessoal, oitiva de testemunhas, quebras de todos os sigilos do investigado (fiscal, telefônico, telemático, bancário etc.), busca e apreensão, escutas telefônicas, grampos etc.], mas a preguiça institucional, malandramente, contorna tudo isso e já lança mão do supra suma do direito pós-civilização brasileiro, a prisão preventiva.
Tem mais: na legislação brasileira há um negócio chamado de “medidas cautelares diversas da prisão” que deveriam ser aplicadas em substituição às prisões cautelares, medidas estas que têm os mesmos objetivos das prisões, mas padecem do defeito de ainda exigir trabalhos de investigação e de não provocar aplausos.
Entendam o espírito da coisa: o aparelho estatal repressor está contaminado pelos vícios da preguiça e do aplauso, ou seja, com a prisão preventiva não se precisa trabalhar tanto com investigações e ainda se tem uma plateia a aplaudir o ato.
Tudo isso até agora dito para constatar que essa situação a que chegou o direito no Brasil também contribui para condutas como a do juiz Marcelo Bretas que deixa de decidir acerca de um pedido de prisão preventiva porque está contrariado com um ministro do STF que revogou outras prisões por ele decretas e, para animar a plateia a seu favor e contra um ministro do STF, o Gilmar Mendes, manda “intimar” o ministro sobre o pedido de prisão.
Sabem qual o fundamento constitucional, convencional ou legal utilizado pelo juiz para assim proceder? Respondo: NENHUM. Na verdade, ele só não gostou das decisões que contrariaram as dele.
É mais uma evolução/construção/criação, o andar para a frente, do direito “macunaímico” depois de tornar a excepcionalíssima prisão preventiva em regra. É o aflorar da figura do juiz de papai, numa analogia ao filhinho de papai, aquele que não pode ser contrariados nos seus desejos, sentimentos etc.
Da minha parte, fico com Lenio Streck, na sua Crítica Hermenêutica do Direito: o juiz não pode substituir o direito pela sua moral.