Eu e o processo penal do espetáculo. Performance vergonhosa de uma democracia

Tenho combatido faz tempo o processo penal do espetáculo. E tenho feito isso porque sei bem das consequências para uma democracia e para os acusados.

Também tenho dito que todos deveriam repudiar tal prática, pois os aspectos nefastos do processo penal do espetáculo poderão um dia bater na porta da plateia que aplaude tal prática.

E eis que eu mesmo, com espanto, vejo-me diante de um verdadeiro caso de processo penal do espetáculo: vários meios de comunicação a propalar que o juízo da 8. Vara Criminal determinou o sequestro de todos os meus bens.

O espanto se justifica porque não tenho conhecimento da existência de processo contra mim que tenha essa finalidade. Portanto, se existe, deve ser processo que tramita em segredo de justiça e, porque sequer os acusados têm conhecimento, óbvio que somente a juíza e o promotor têm conhecimento do processo e da decisão.

Como uma decisão dessa surge nos meios de comunicação e por quê?

Respondo, para o caso concreto, que o porquê se encontra nos interesses político-eleitorais do atual governador do Maranhão que recebeu cópia da decisão.

A decisão chegou aos meios de comunicação porque o atual governador do Maranhão repassou a decisão para os jornalistas que participam do enlace político-administrativo-eleitoral dos que atualmente ocupam o governo do Estado do Maranhão.

O vazamento de decisão de processo em segredo de justiça será investigado? Duvido.

Não duvidem que antes que os acusados sejam citados no processo outros detalhes sobre o processo e da decisão serão publicados, ineditamente, ou “exclusivamente”, pelos jornalistas que mantém essas “estreitas” relações com o maior interessado na decisão, o atual governador do Estado.

O que me deixa (ainda) estupefato é o Poder Judiciário se submeter a esse tipo de “jogada”, pois é chamado para decidir em segredo de justiça o que será, num ato vil e furtivo de quebra de confiança, jogado ao vento logo que o pedido for atendido.

É lógico que o objetivo pretendido é constranger e intimidar os acusados, o que nem sempre ocorre, como no meu caso, até porque é certeza absoluta que não há motivos para temer a estapafúrdia acusação. Mas o ato é mais grave, porque atinge terceiros que não são acusados (familiares, amigos etc.) e, sobremaneira, aquilo que é mais precioso num estado civilizado: o cumprimento das regras do jogo, o respeito à Constituição, aos tratados e declarações de direitos.

Lastimável que o Poder Judiciário, constitucionalmente vocacionado para a proteção dos direitos e garantias fundamentais, seja usado como mero intermediário na realização de objetivos político-eleitorais. Cobra-se, portanto, que a juíza que preside o processo ponha cobro a essa prática, até porque quem passou a cópia da decisão para o governador não foi a juíza.

Com efeito, é preciso que o Poder Judiciário ponha ordem a si mesmo, sob pena de perder credibilidade e se tornar apenas um braço de artimanhas como a produzida no caso aqui tratado. A forma de por cobro a isso é simplesmente dar publicidade ampla e irrestrita ao processo, pois assim todo o povo dele terá conhecimento e acesso a todas as informações, e não apenas às partes que interessa ao privilegiado (governador do Estado) que detém uma cópia da decisão.

Ponha-se democracia no processo (legalidade, legitimidade, transparência, isonomia, impessoalidade etc.). Escorraçai os sujeitos que desavergonhadamente querem manipular o Poder Judiciário.

Abstraída a questão legal, sinto compaixão pela pessoa que se presta ao vil e servil papel de mero “avião” dos eventuais infortúnios dos acusados para levá-los ao governador do Estado.

Da minha parte, no momento nada tenho a declarar sobre o caso porque absolutamente ignoro o que há no processo. Depois que tiver conhecimento do processo, já pelas publicações promovidas pelo governador, já por meio do Poder Judiciário, quem chegar primeiro, irei apresentar, nos autos do processo e aqui, a minha manifestação.

Quiçá os acusados não serão presenteados com a decisão na capa de um jornal?

Até lá o “dono” da decisão do processo continuará a usá-la como lhe convém e os acusados relegados a ser apenas objetos do processo.

Eis a performance da maior vergonha de uma democracia.

3 comentários em “Eu e o processo penal do espetáculo. Performance vergonhosa de uma democracia”

Fabio Abbondanza | em: 11/03/2017 às 20:21

Não entendo como até a Justiça se dobra ao atual governador de maneira vergonhosa. Quando compartilho algumas Decisões com meus pares de outros estados a estupefação é geral. Profundamente lamentável!

Haroldo Teixeira da costa | em: 12/03/2017 às 07:05

Verdade esse governo.

Deixar um comentário para Fabio Abbondanza

HTML tags:
<a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>